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Saturday, April 30, 2011

Marxismo: a via Groucho: por Sir Frankie Goethe Wally Wood

Sempre que me perguntavam a minha ideologia eu respondia: Marxista, segundo a linha Groucho. E ainda me sinto assim. Os irmãos Marx, de que Groucho era incontestado expoente, eram mais revolucionários do que muitos maduros armados, com cara de maus e a gritar como histéricos. Claro que nunca pertenci ao Partido Groucho porque o próprio, o verdadeiro, confessou que nunca aceitaria fazer parte de um clube que o aceitasse como sócio. Isto cria esta situação paradoxal em que me sinto: haverá ainda algum asilo de doidos que aceite mais um? evidentemente que não: todos os loucos do Universo parecem tão concentrados em defender as suas loucuras pessoais que nenhum parece  disposto a dar um pouquinho de atenção á loucura alheia. 
Groucho não era um ingénuo como Charlot, nem tagarela como grande parte de tantos outros comediantes antigos e actuais, os da stand-comedy à cabeça da verborreia. Não era homem para grandes monólogos ou floreados humorísticos: as suas piadas normalmente constavam de frases curtas, incisivas e contaminadas por um espírito deliciosamente absurdo. Tudo aquilo que atormentou outros filósofos, para Groucho era motivo de risota, e esta foi uma via que só talvez Woody Allen prosseguiria com êxito. Ele ridicularizou  os mais gratos conceitos da sua civilização pseudo-religiosa, não poupou os mitos urbanos, brincou com a imprecisão da linguagem, coisa que tanto tinha preocupado Wittegenstein, pôs a ridículo fórmulas e convenções sociais, descontextualizando-as e abrindo terreno a uma nova escola de humor. Mesmo que os seus filmes tenham caído no esquecimento momentâneo, naquele limbo onde dormem todas as obras que realmente contam, acredito que um dia os Marx Bros. regressarão, em toda a sua força, para galhofeiramente ocuparem o lugar que sempre foi deles na História Universal da Comédia ou Na História da Comédia Universal, que é nome que os manos todos decerto prefeririam. 
  Seja como for, tenho este sonho recorrente: Groucho caminha a meu lado num parque e pergunta-me se tenho fome. Respondo-lhe que sim e ele encolhe os ombros e diz:
- Também eu, mas nada a fazer: Só há almoços grátis pra quem possa pagar... 

Friday, April 29, 2011

Futeboys: pelo comentador Rolando Campos e Relvas

Ah, meus fans e admiradoras cá estamos de novo, depois de um merecido descanso. E que semana tivemos, plena de emoções dentro e fora dos campos. Vamos à análise dos três jogos que concentraram  todas as atenções dos portugueses. Comecemos pelo embate de gigantes no país aqui do lado...

R.Madrid-Barcelona- A «competição» começou fora dos relvados, com as «bocas» de Mourinho ao cavalheiro Pepe Guardiola que lembrou ao português uma evidência tantas vezes esquecida por quem enaltece os chamados «mind games»: que por «campeão» que o Mourinho seja da má-língua, os jogos se resolvem no campo. E assim foi, de facto. Provando que uma dívida galáctica aos bancos não basta para fazer um campeão, o Barcelona humilhou o Real na sua própria casa, dando-lhe um banho de futebol que só ainda os distraídos teimam em não ver. Com uma posse de bola esmagadora, (a rondar os 80%), e mais passes acertados, só mesmo os «ceguinhos» ainda batem na tecla da expulsão do «luso» Pepe, por entrada perigosa (pé em riste) para explicar o descalabro «merengue».
Depois, a classe de Messi fez o resto: o «Pequenino» mostrou que os jogadores de futebol não se medem aos palmos, nem às palmas, menos ainda pelo «caroço». Esplêndido na arrancada do segundo golo, «papou» cinco grandalhões que, confrontados com a sua estonteante velocidade e decisão, mais pareciam homens estátua.
Nesta altura, já o Real estava reduzido a espectador do jogo, tal como o seu treinador Zézito (Zéquinha prós amigos) que já só seguia o descalabro da bancada, treinando  os esgares que mais tarde faria diante da imprensa. Depois de ter sugerido, dois dias antes, que Guardiola integrava, sozinho, o grupo de treinadores que só se queixava das boas arbitragens,  Zé Calimero Mourinho, veio chorar das injustiças do mundo que o impedem  de vencer para todo o sempre, e sempre à custa de um futebol feio, irritante e manhoso, com constantes «requerimentos à secretaria» para atrasar, perder tempo e não jogar, pelo menos enquanto se sente em vantagem. A esta espécie de «real-politics» do futebol há quem chame sabedoria. Para os que só consideram o resultado e desprezam o jogo, até pode ser assim. Mas para os que, como eu, colocam a qualidade do jogo acima do resultado (ou seja os que gostam mesmo de futebol)  Mourinho e seus apaniguados não passam de uma trupe de primas donas com desprezíveis características de empata-fo-inhas...

Benfica-Braga- Lá ganhou o Benfica, pela vantagem mínima e depois de algum sofrimento. Eu que estava lá, vi que Jorge Jesus (JêJê, prós amigos) inaugurou uma nova forma de «mind-games» que muita inveja faria ao Zézito acima referido: deitou a língua de fora a Domingos Paciência. Se resultou ou não, é cedo para dizer, porque ainda falta a segunda mão para decidir o desfecho. Ignoro que efeito este gesto terá sobre o futuro treinador do Sporting, mas que eu fiquei desmoralizado, não há dúvida nenhuma: aquela língua assusta qualquer um porque nunca se sabe se dali não vai sair uma daquelas tiradas a que ninguém sabe responder. Sim, que para responder a certas comentários, há que entendê-los primeiro... 


Porto-VillaReal- Esta até pode ser a semana do Casamento pseudo-real inglês mas não foi a semana dos Reais. Este Real, que é Villa e não Ciudad, levou pela medida grande. No fim da primeira parte, o submarino amarelo veio à tona e mandou um torpedo certeiro no Porta aviões FCP. A partir daí, os tiros do tal submarino só atingiram água. Em compensação, o FCP pôs o seu artilheiro mor a disparar e afundou os amarelitos de vez. Para tal, muito contribuiu o vôo do Falcão: Quatro tiros certeiros dois em que usou a cabeça. Desfez-se a dúvida: teremos mesmo uma final portuguesa, na Liga Europa. A menos que o FCP resolva fazer da sua vantagem o que os nossos desgovernantes andam a fazer da Economia Nacional: sabotagem (dragão, dragão, dragão, que aqui não se pode dizer lagarto, lagarto, lagarto)...

Thursday, April 28, 2011

História Universal da Cuskice - pela Dra. Glória d'Anais de Guerra e Antas



E o machado, a lança, a faca, o arco e flecha, as peles?

Bom, é verdade que todos esses instrumentos domésticos davam jeito, caso contrário ninguém se daria ao trabalho de os fabricar, não é verdade? convém, no entanto, não exagerar na importância destas pequenas conquistas. Mais importante que todos estes utensílios foram a cana de pesca, para os homens e o pente para as mulheres. Porquê? porque só estes dois instrumentos permitiam a uns e a outras passarem horas e horas de ociosidade junto ao rio, uns fingindo que pescavam, outras fingindo que se penteavam, sem que nenhum passante se interrogasse da seriedade de tudo aquilo.

Já vimos que os primeiros hominídeos eram criaturas pouco sociáveis. Apesar disso ou por isso, construiram muitas comunidades. Além das guerras havia comunicação regular, entre essas comunidades?

Entre os Hominotes havia o hábito de visitar parentes, de inquirir do seu estado de saúde e voltar para casa outra vez, a menos que o parente em causa fizesse o favor de se finar. Nesse caso, era festa da rija, durante três dias, a expensas dos pobres familiares do defunto. Caso contrário, havia que regressar educadamente e educadamente esperar pela morte do dito e pelos tais três dias de farra. Estas visitas eram regulares porque os Hominotes vigiavam-se com afinco, em virtude da sua cusquice natural mas também por uma questão de heranças. Uma velha lei nunca escrita mas muito interiorizada estabelecia que os familiares ausentes no funeral de um Hominote perdiam automaticamente todo o direito à sua parte dos despojos. Dito de outra maneira: quem estava repartia entre si e da decisão não havia recurso. Isto fazia com que todos quisessem sempre estar presentes, embora alguns trabalhassem para que outros não fossem informados a tempo.

E quanto a comércio? Havia comércio, entre estes povos?

Naturalmente, trocava-se de tudo e o nosso famoso palito, que ajudou na descoberta do fogo, foi a primeira unidade monetária da pré-história. Havia decerto limitações no sistema contabilístico destes nossos antepassados visto que nada podia custar mais que dez palitos,. Mas também ninguém era obrigado a colocar à venda nada que achasse de valor superior. À parte essa função, os palitos também ajudavam a arredondar as trocas directas. Duas galinhas e dois palitos valiam um coelho. Dois coelhos, duas galinhas e dois palitos valiam um leitão. Se bem que para se ter dois palitos, naquela altura não era preciso muito: uma distração de um dos conjuges, por breve que fosse e...pimba!

Porque se atribuía tanto valor ao palito?

Em primeiro lugar, porque a comida mal passada ou crua metia-se entre os dentes e não havia escova. Em segundo lugar porque, com o mesmo formato, servia para fazer fogo, para picar o parceiro sem o matar e, finalmente, porque era um produto que demorava o seu tempo a fabricar. Para a sua manufactura, requeria-se uma madeira especial, macia saudável, de bom talho. Infelizmente, os instrumentos, tal como os artesãos da época, deixavam muito a desejar quanto à precisão das respectivas funções e assim derrubavam-se duas árvores adultas para fabricar cerca de cinquenta palitos. Tudo o resto era cascalho para queimar.

Há vestígios desse valor do palito, nas línguas vivas?

Certamente que há; como a expressão em português «custou-me cento e picos» ou, ainda há poucos anos, antes da entrada do euro, « custou-me quinhentos paus».

Que meios de transporte utilizavam os primeiros Humanos?

De início andava tudo a penantes. Depois, desde que Arborícola III falhou a caça de um pónei tendo de se lhe agarrar ao pescoço para não cair, todos aprenderam que aquela era a maneira mais rápida de se porem a milhas. Mesmo assim, nem todos se atreviam a montar equinos. Um grande número de primatas pelados preferia cavalgar os seus semelhantes: eram mais lentos mas mais obedientes.

E quanto às vias fluviais? Havia jangadas?

Havia pelo menos tecnologia para fabricá-las mas os antropóides não viam grande utilidade no seu uso. Nunca deixavam a população crescer a um ponto que fosse preciso expulsar muitos de cada vez. Normalmente, despachavam-nos um a um. Mesmo se decidissem fazê-lo por via fluvial, um tronco e uma corda bastavam para expulsar o excedentário, com a ajuda da corrente. Tal como a roda, também as viagens fluviais funcionavam apenas num sentido: para baixo, sempre para baixo.

Nota de Joaquim Silva: Enquanto não reorganizo o blog, contando com os colaboradores que já tenho (excepto talvez a Esmeralda  Preciosa da Cunha, cuja convalescença ameaça ser longa) a Dra Glória, graças à sua lábia, aproveita e vai publicando. Diga-se de passagem que o tem feito com sucesso e assinalável número de leitores, o que deve querer dizer que a cuskice ainda rende, eh eh eh.. (e não chegámos ainda a essa parte da cuskice...). Amanhã será dia de Rolando Campos e Relvas, pois ontem e hoje houve e vai haver chuto...na bola...

Wednesday, April 27, 2011

os ‘Razíadas’ por Luís de Cá , Mões (Beira Alta) Canto 3º, estr.5 a 8


Além disso, o que a tudo enfim me obriga 
É não poder mentir no que me arroja
Porque qual parasita, qual lombriga
É sugador, que por aqui se aloja
Corrói o mesmo corpo em que se abriga
E desta guisa,  já só dele se despoja
Quem largue lastro, de forma expedita
Depositando-o no fundo da sanita

E ainda é preciso ao autoclismo
Dar ordem de descarga bem violenta
P'ra que não ataque outro organismo
Roubando-lhe a seiva qu'o sustenta
E assim se jogue em fundo abismo
A criatura indesejada e nojenta
Que nas entranhas vive e procria
À custa de quem dela, nem sabia

Venha pois o remédio e o purgante
Antes que o Pátrio corpo, enfraquecido
Desfaleça. Ò corpo ignorante
De todos males de que tens padecido
Pois não se anuncia, o verme tratante:
Traz seu hospedeiro adormecido
Criatura falsamente inofensiva
que no interior de nós, nos suga a vida

E a todos os outros vermes cujo nojo
É tanto que sem qualquer piedade
O hospedeiro, decerto já de rojo
o teria esmagado, se na verdade
Vê-lo pudesse, pois que arrojo
Não falta ao ser, nem a vontade
De exterminar quem o afronta
-Assim de seus males, ele desse conta  

(Continua na próxima quarta feira)

Tuesday, April 26, 2011

História Universal da Cuskice - pela Dra. Glória d'Anais de Guerra e Antas

A expansão dos Humanotes e outras conquistas 

Como explicar o sucesso da nova espécie? 

Vejamos: sucesso, sucesso, não será o termo adequado. Na verdade foi o insucesso da espécie a ditar a sua proliferação. Apesar de não serem muitos, os primeiros semi-humanos não se suportavam uns aos outros. Os seus grupos nunca ultrapassavam o número de dez indivíduos, que era o máximo que todos, (sobretudo o chefe), podiam contar com os dedos das mãos. Mais do que isso, dava confusão e, nessa altura (como hoje), a confusão dá sempre lugar à violência. Portanto, sempre que alguém estava a mais, era expulso para longe, normalmente à má-fila. O critério de quem «estava a mais» era, naturalmente, o do chefe, sempre desconfiado, sempre em tensão, sempre procurando actualizar os registos dos seus súbditos pelos dedos das mãos. Foram os primeiros registos digitais e, através deles, o Primata chefe fazia corresponder o Polegar direito à sua esposa, o indicador direito ao irmão mais novo, o médio direito a si mesmo, o anular direito ao seu cunhado, o mindinho direito a seu filho mais velho, o seu polegar esquerdo à sogra, o seu indicador esquerdo ao seu irmão, o médio esquerdo ao seu médio pai, o anular esquerdo a sua irmã e o mindinho esquerdo a seu sobrinho. 
Foi por não se suportarem uns aos outros que os humanotes se expandiram rapidamente pelo globo. Para se instalarem o mais longe possível dos seus parentes mais próximos, atravessaram cordilheiras, rios, oceanos, estepes e desertos, em épica fuga para a frente, cada vez mais longe, cada vez mais rápido, cada vez mais alto. Não lhes serviu de nada: onde quer que chegassem já alguém tinha estado antes e não importa quando chegassem, muitos se lhes seguiriam depois. 

Que outras invenções/ instrumentos, além do pau, potenciaram o desenvolvimento do intelecto humano? 

Sem dúvida a mais importante de todas as conquistas humanas é o fogo. Quem já tentou comer carne crua e/ou já rapou briol sabe do que estou a falar: é impossível ter uma ideia decente enquanto se masca carne crua ou enquanto se tirita de frio. 
Interessa porém definir o que se entende pela descoberta do fogo: o maduro que viu pela primeira vez um incêndio, não alterou a Pré-História. Já aquele que, pela primeira vez, fincou o dente num bom guisado de coelho, pode-se dizer que inaugurou uma nova era para a sua espécie. O mesmo se pode dizer daquele que, pela primeira vez, adormeceu junto ao fogo, numa fr...ia fr...ia noite de Inverno. 
Sem os confortos da cozinha, do aquecimento e iluminação do lar, o intelecto humano seria tão pobre, frio e desolado como uma gruta apagada. 
« Numa certa manhã da estação seca, Humanote 9, o mais inepto dos caçadores Humanatas, atropelou um coelho que fugia de uma raposa. Feliz pela inesperada refeição, não perdeu tempo, dando-lhe de imediato uma paulada logo seguida de uma trinca. Resultado de tanta gula: durante o longo tempo que dedicou a cuspir e tirar com os dedos aquele nojento pêlo da boca, jurou que dominaria o instinto e que não voltaria a pôr-lhe o dente antes de o esfolar. 
Assim fez, acabando por comer apenas a carne de duas coxas, após um interminável mastigar. Agora tem um grande peso no estômago e pedaços de coelho cru entre os dentes. Precisa de palitos mas está longe da sua gruta. Olha em volta e não vê nenhum dos arbustos que ele e os seus usam para fabricar aquele artigo de higiene oral. Em lugar disso, apenas gravetos meio secos, demasiado grossos para o fim que lhe interessa. Tenta sacar-lhe lascas, mas aqueles pedaços de madeira não partem da forma mais conveniente. Então lembra-se de poli-los. Começa a esfregar um pequeno galho sobre uma casca seca de árvore. O trabalho avança pouco, a carne no meio dos dentes massacra-lhe as gengivas. Impacienta-se e esfrega cada vez com mais força, até que solta um grito e deixa cair o graveto em brasa no meio do capim seco. O fogo imediatamente alastra. Humanote consegue escapar com vida e não completamente chamuscado com a experiência. Tanto assim que voltará logo logo, atraído pelo cheiro que emanava do resto do coelho. Ao comê-lo, notar-lhe-á uma textura mais delicada, um sabor mais apurado, um mastigar menos trabalhoso e sobretudo, sobretudo, uma digestão infinitamente mais fácil, para já não falar da expulsão, bem menos dolorosa. O fogo acabara de fazer o seu primeiro converso e, ao mesmo tempo, o seu primeiro sacerdote. 

E a roda? Não foi a roda também um importante invento? 

Sinceramente, ná!!! 
A roda nem chega a ser uma descoberta, quanto mais uma invenção! . Não me restam dúvidas que se tratou de um vulgar acidente. Eventualmente foi descoberta por Hominote, o Irrequieto ao subir um tronco perfeitamente cilíndrico, colocado em equilíbrio instável num declive. Embora não se tivesse saído mal nas primeiras voltas, o tronco acelerou cuspindo-o contra a Rocha Verde (assim designada por causa do musgo e da baba dos caracóis), pancada que não o fez mais estúpido do que o que já era, mas que o tornou muito mais irritadiço. 

Pese o energúmeno ter pensado, mais de uma vez, aplicar o princípio dos troncos rolantes à sua família mais chegada, a verdade é que, além dele, mais ninguém via vantagens nesta descoberta: excepto em casos de declive, a roda ajudava pouco, visto que alguém tinha sempre de puxar. E até à domesticação dos bois, a verdade é que ninguém queria puxar. 

Monday, April 25, 2011

Revoluções e Famílias Oportunistas por Lilith Lovelace

«Os tempos da Velha Senhora já lá vão», ouço tantas vezes dizer a alguns amigos distraídos. Gostaria de lhes dar razão mas, como sou uma pessoa atenta, não posso fazê-lo. A tal Velha Senhora, no caso Português, foi apenas passar umas férias ao Brasil, fez uma plástica ao rosto e de lá voltou, revigorada e gaiteira como nunca, agora que sabe que pode mudar de cara de quatro em quatro anos ou até menos, se houver eleições antecipadas. 
Ainda hoje se discute se o 25 de Abril de 1974 foi, de facto, uma Revolução ou antes um Golpe de Estado. Alguns militares da brigada do reumático não se cansam de dizer que foi graças a eles que se instaurou, em Portugal, um regime democrático(?). Não nos dão grande novidade, porque, de certa forma, a eles se deve também a Ditadura, a República, a Restauração e a Independência do Reino (com a inestimável ajuda dos outros todos, dos Fortes Anónimos de que não reza a História). 
Mas no lugar deles, em vez de me gabar disso, ficaria caladinha pois está-se sempre a tempo de lhes pedir contas da merda dos regimes que andam a impor aos Portugueses, desde o tempo dos Afonsinhos.
E quanto ao vinte e cinco de Abril...bem, aquilo nem foi bem uma revolução, pois não? Se usássemos a mesma metáfora do parágrafo posterior (isto é um texto interactivo, já prevê o que será escrito a seguir), teríamos de acrescentar que o povo, ali, foi uma espécie de penetra de uma festa em relação à qual, aliás, tinha recebido indicações expressas de nem se aproximar. Só que os militares golpistas cometeram um erro terrível: noticiaram a coisa na rádio. O povão ficou logo a saber que havia festa e não quis perder pitada. Enquanto a festa durou, como dizia o Chico que tem de Holanda no apelido, foi bonita. Depois veio a conta. E a conta, meus amigos, ainda hoje os Portugueses andam a pagá-la, sempre com juros ascendentes.
Pessoalmente, nunca fui grande adepta das Revoluções que são um pouco como as festas da estudantada: muito barulho, muita confusão e, no fim, há sempre muita sujeira que ninguém quer limpar. Prefiro os verdadeiros golpes de estado, os clássicos e canónicos que terminam com a velha classe dirigente encostada à parede. Mas, como sou um verdadeira democrata e sei que muita gente se opõe ao derramamento sangue, também não me importo se, em vez de fuzilados, os actuais cleptocratas forem simplesmente afogados nas Estações de Tratamento de Águas Residuais, para preservação de rios, lagos e mares.
A vantagem dos golpes de estado relativamente às revoluções não se limita às tradicionais questões de higiene. Um golpe de estado bem organizado, se for levado até às últimas consequências, dispensa povo nas ruas, reuniões partidárias e outras palhaçadas folclóricas do mesmo jaez.
Vantagem adicional: resolve, sem comités, votações e outras farsas (porque infelizmente só servem para inglês ver) , que o maduro que fica no poder é mesmo o mais mauzão. Porque efectivamente, só um tipo pior que os mauzões todos juntos pode castigá-los como os oprimidos sabem que eles merecem. Claro que depois também é necessário tratar do grande mauzão, de preferência antes que ele ganhe o gosto «à coisa». Se isto se fizesse assim, teríamos novidade, pois normalmente acontece o contrário:  os «mauzões», liquidados os seus grandes inimigos, entusiasmam-se e acabam por encostar o povo à parede. E para encostar o povo à parede, não são necessários grandes «mauzões», bastam uns milhares de crápulas, comandados por uma troika de Mafiosos, como se vê na actual situação portuguesa...

Sunday, April 24, 2011

O Livro de Jemerias & Sócios

(continuação do último domingo )

Breve resumo: Daniel foi chamado à presença de Nabuco, imperador dos Gabalónios, para interpretar o célebre sonho do gigante com cabeça de ouro, tronco de prata, braços de cobre, pernas de ferro e...pila de barro. Após breve diálogo, o Rei dos reis, passou-se com a explicação dada pelo jovem profeta e ordenou que o lançassem num fosso repleto de leões...

Ansiosos por mais um espectáculo grátis, os soldados agarraram em Daniel e arrastaram-no para o pátio, onde o jogariam aos leões. Ouvia-se já o rugido das feras esfomeadas quando o jovem sentiu uma enorme vontade de urinar. Antes que pudesse fazer algo, sentiu o líquido correr-lhe pelas pernas abaixo. Foi então que se lembrou do pormenor (era mesmo um pormenor) da pila de barro. Não ousara tocar nesse assunto porque receara a reacção do Senhor dos senhores. Mas agora, que estava prestes a servir de pasto às feras, já não tinha nada a perder. Encheu os pulmões de ar e gritou desesperado::
- NABUCO!!! ESTÁS A OUVIR-ME? EU AINDA NÃO TINHA ACABADO A MINHA INTERPRETAÇÃO!!!...FALTAVA-ME AQUELA PARTE DO CORPO QUE ERA DE BARRO...VAIS OUVIR-ME EM PRIVADO OU QUERES QUE EU FALE DISSO EM PÚBLICO? OLHA QUE DAQUI À FOSSA AINDA DÁ PARA CONTAR A HISTÓRIA TODA!!!...OOUVES-ME Ó MEU SENHOR?...
Teve sorte por gritar assim, pois o Imperador tinha vindo à janela para assistir ao espectáculo e, receoso que aquele segredo de Estado pudesse ser revelado em voz alta, ordenou aos guardas que trouxessem de volta o profeta, nascido entre o povo escravo dos Abreus.
Fechou-se com ele na sala do Trono e olhou-o furioso dizendo-lhe assim:
- Pois meu linguarudo, fica sabendo que por menos do que isto, já ordenei que se fritassem os tomates (em óleo de palma) a muito chico-esperto, sem os mandar seccionar primeiro. Será bom que tenhas algo útil a dizer-me senão, vais ter inveja dos muitos que mandei servir de sobremesa aos leões...
- Piedade, meu nobre, grande e generoso Senhor! mas eu sei que vos posso ajudar. Conheço maneiras de resolver o vosso problema. Tanto o do tamanho como o...bom, da falta de firmeza, se é que me entendeis...
- Entendo-te bem, ò parolo, que te mijaste todo pernas abaixo só por causa de uns leões que estão na fossa. Despacha-te lá com o que tens a dizer que eu tenho um compromisso com a Roxana, uma das muitas concubinas boazonas do meu harém e não quero fazer má figura...
- Bom, nobre Senhor: quanto ao tamanho, eu conheço uns acessórios que os homens menos dotados do meu povo usam, para enganar as miúdas. Quanto à rigidez, conheço um unguento que se esfrega e...bom, faz milagres. Diz-se que vem lá das Áfricas, onde nenhum homem padece desse mal que tanto aflige os machos da Gabalónia...
E assim o profeta ganhou tempo, pois Nabuco não ousou fazer-lhe nada enquanto não experimentou as duas receitas. O unguento até funcionou, mas o tal acessório via-se bem que era isso mesmo: uma prótese que, ainda por cima, lhe retirava sensibilidade e que nem por isso dava gozo às suas insaciáveis concubinas. Ora acontece  que tanto estas escravas como os eunucos eram muito calhandreiros e a emenda (literal, neste caso) foi pior que o sómeto (tipo de poema obsceno muito popular deste tempo e lugar). Em breve, por todo o Império Gabalónio, os arautos (declamadores) glosavam o tema com abundantes pormenores marotos. Deixo-vos apenas dois exemplos (a tradução é minha, que domino as línguas mortas de todas do Minguante Estéril):

«Por ter pila de menino
o tal qu'esta rima acusa
enfaixou-a com velino
e perdeu, de vez, a tusa...»

Ou, noutra versão ainda mais licenciosa:

OH! que ideia tão tonta
mas quem t'a deu, ò trouxa?
Antes pequena e com ponta
do que grandita mas frouxa

Claro que Nabuco foi informado logo, logo, da chacota de que era alvo, pois não faltavam lambe-botas estúpidos e delatores idiotas no seu vasto Império. Estúpidos e idiotas claro, que o Rei dos Reis exigia que lhe declamassem essas quadras para aferir da sua veracidade. E aqui, não havia salvação possível:: ou lhe obedeciam e eram mergulhados em Pez fervente, por terem memorizado frases Lesa-Majestade, ou eram devolvidos às famílias, por episódios (primeiro o mindinho, depois a mão, etc...até que o corpo ficasse completo para ser enterrado).
E o nosso Daniel? bom, esse foi mesmo juntar-se aos Leões na fossa. Não foi o fim dele, pois tratava-se de um rapaz cheio de recursos, como veremos. Mas isso fica para o próximo domingo, pois é preciso manter a coisa «suspensa» como os tais famosos jardins da Gabalónia...


Saturday, April 23, 2011

História Universal da Cuskice - pela Dra. Glória d'Anais de Guerra e Antas

Uma palavra basta para se falar de linguagem oral?

Não, porque uma palavra não faz uma linguagem. Para haver linguagem oral é necessário haver muitas, muitas palavras, todas ligadas entre si por nexo lógico de sequência e intencionalidade. Ou seja, são necessárias horas de disponibilidade para a conversa e, não menos difícil, ter assunto para mantê-la. É por isso que a linguagem não pode ter sido inventada por um homem só. Estou mesmo convencida que a linguagem foi criada por uma mulher só.
Infelizmente, graças ao enorme déficit de memória dos primeiros hominídeos, essa primeira experiência traumática pouco ensinou aos machos Totós que continuaram a temer a língua das parceiras, em lugar de aprenderem a falá-la ou (ainda mais simples), de se conformarem a viver em celibato.
Foi necessária uma experiência extrema para pôr um Totó a falar. A coisa passou-se assim:

« Uma grande crise assola o Planalto de Asdekavir. A persistente falta de chuva e o calor excessivo secaram os pastos e impossibilitaram as árvores de dar fruto. Os herbívoros, por falta de plantas, partiram. Os carnívoros, por falta de herbívoros, partiram. Os omnívoros, por falta de plantas e de herbívoros, partiram. Os poucos Grunhos machos, derrotados e humilhados, partiram. As fêmeas Totós, suplantadas pelas rivais grunhas, partiram. Pouco atentos à migração geral, os Totós, as nóveis esposas Grunhas e descendência de uns e outras ficaram.
Embora de dia para dia se tornasse cada vez mais difícil arranjar alimento, numa primeira fase, não se saíram mal: sem a concorrência dos outros animais todos, primos e primas incluídos, puderam desencantar raízes, sementes e um ou outro mamífero demasiado enfraquecido para seguir a longa migração. A sorte, porém, não dura sempre e, num feio dia de Inverno, comido o último coelho famélico, o clã dos Totós compreendeu, tardiamente, que duros tempos se aproximavam.
Mesmo sem o dom da fala, sabiam ser demasiado tarde para partir: já todos lhes levavam um grande avanço. Em face da desoladora circunstância, depressa concluíram que era preciso encontrar um culpado, de preferência antes da hora da próxima refeição. Um relance pelo grupo indicava que Totó três era o melhor fornecido de carnes. Essa leitura, podemos acreditá-lo, fizeram-na todos os Totós presentes na caverna, Totó três incluído.
E foi aí que tudo aconteceu: aflito com o ar reprovador dos seus companheiros e companheiras (há crime maior que ser gordo em terra de magros?), receando o ataque eminente, num acto de desespero, soltou a língua e falou, longamente, mesmo sem uma linguagem estruturada e sem palavras definidas. O curioso é que os outros Totós compreenderam que, com aqueles estranhos sons, ele lhes explicava que a razão de ser assim anafadinho, ao contrário do que pudesse parecer, não residia em comer mais do que eles mas antes em aproveitar melhor o pouco que comia.
Entenderam também que ele rejeitava a culpa da falta de chuva e concomitante migração da bicharada. Até detectou neles alguma simpatia, quando lhes explicou que cozinharem-no só resolveriam o problema por um ou dois dias, considerando o notável apetite dos fedelhos. Na verdade, todos estavam prontos para deplorar, com ele, a baixeza do instinto animal que os levara, por um momento que fosse, a considerarem-no como peça comestível. O seu longo discurso, levou às lágrimas as senhoras Grunha uma e Grunha três e Grunha Três e os guerreiros Totó um, Totó dois e Totó quatro, ao aplauso ruidoso.
Finda a dissertação, quando o infeliz já se julgava a salvo, Totó um esmagou-lhe o crânio com uma mocada certeira. Grunha uma e Grunha duas esquartejaram-no. Totó quatro e Totó cinco assaram-no no espeto. A seguir, todos o comeram com redobrado apetite, considerando o tempo que dedicaram a ouvir aquelas patranhas, mais o tempo de grelhar os nacos do bicho em brasas de cedro de lei.
Aos cépticos que, por este desolador canibalismo, duvidarem que houve aqui um arremedo de linguagem oral, posso garantir que a ameaça de violência basta, normalmente, para pôr qualquer Totó a falar fluentemente, mesmo que não saiba bem o que está a dizer. Quanto ao facto de Totó três ter sido grelhado, apesar do seu discurso, relembro a actualidade do gesto: Ainda hoje, todos os Totós falam para se salvar. Ainda hoje, todos os Totós se fritam por terem falado demais.
Apesar destas primeiras tentativas, a fala, tal como a conhecemos hoje, continuava a não suscitar grande adesão, nem entre Grunhos, nem entre Totós que preferiam continuar a resolver tudo à paulada.

Então a linguagem oral foi inventada e logo esquecida?

Sim, o que faltava aos Macacos Pelados não eram capacidades vocais (essas até eram notáveis) nem falta de percursores (houve muitos, como veremos). O que lhes faltava, antes do mais, era a motivação para falar. E de início, nem os Grunhos nem Totós viam grande interesse na conversa fiada. Falar de quê quando basta grunhir alto, fazer cara de mau ou dar uns tabefes para ser obedecido? Isto não nos deve parecer estranho: um invento raras vezes suscita entusiasmo inicial. Presos aos seus hábitos, os Pelados de então encararam a fala como uma dessas modernices que se dispensavam de adquirir.
Outras tentativas foram surgindo, umas dando origem a experiências duradouras de construção de uma língua, outras perdendo-se sem deixar rasto. Até que um dia...

Como? a linguagem oral fez-se num dia?

Um dia é força de expressão: também pode ter sido numa noite. Imagine-se uma fêmea grunha enquanto espera pelo Totó pai de cinco das suas dez esfomeadas crias. E agora imagine-se a sua fúria quando, depois de horas de choradeira dos rebentos, o vê chegar à gruta, de mãos a abanar, mas com um ar estranhamente feliz e um hálito mais azedo que de costume. Que lhe fará ela, em tal circunstância? Não pode bater-lhe porque, embora lambão, ele tem mais força que ela. Não lhe pode pedir o divórcio porque nesses tempos não há pensões de alimentação para ninguém.
Resta-lhe a grande arma dos Grunhos: as cordas vocais. É certo e sabido que ela vai gritar-lhe tanto aos ouvidos que a criançada triplicará o volume da choradeira. Este alarido vai enfurecer os vizinhos que se porão também a gritar, contra a família barulhenta. A partir daqui não restará, ao infeliz, senão sair da gruta a correr e só voltar quando tiver apanhado algo com que atafulhe as bocas da mulher, da criançada e até de um ou outro vizinho que sofra de insónias.

Foi então só para atazanar o conjuge que se inventou a linguagem?

Não sejamos redutores: por Grunha ou Totó que nos pareça, a fala não serve apenas para atazanar o (a) conjuge,. Pode muito bem servir para atazanar outras criaturas. E pode também servir para enrolar o próximo ou, o que ainda é mais elaborado, gozar com ele, mal o tipo se afaste. Eu penso que, de uma forma ou doutra, a linguagem cumpre todas essas funções e em todas elas pode ou não ser bem sucedida, consoante o Patuá do comunicador.

O que é o Patuá?

O Patuá é a primeira língua falada pelos Macacos Pelados, logo, a língua mãe de todas as outras. Dela derivam portanto todas as línguas humanas e mesmo algumas línguas semi-humanas como o madeirense e o açoriano. Na sua primeira forma, o Patuá tinha uma utilização limitada à caça, às disputas domésticas e ao comércio forçado (tipo: ou me trocas esse porco por este coelho ou ficas sem porco e sem coelho). Com a passagem do tempo, a língua sofisticou-se e passou a servir também para o boato, a gabarolice, a maledicência e a cuskice. Em todos os casos porém, o objectivo central de quem falava Patuá não era tanto comunicar quanto mostrar ao outro quem era o mais esperto. Escusado será dizer que muitas das estruturas mentais do Patuá estão presentes nas línguas que a humanidade actualmente fala.

Que evidências existem da persistência do Patuá nas Línguas Modernas?

Expressões infantilmente enganosas como ‘Vai ver se eu estou lá fora’, ou ‘e tu que pediste ao Pai Natal este ano, meu menino?’ mostram-nos que enrolar os Totós é a função primeira e última da linguagem oral. Expressões mais ou menos inocentes como ‘morde aqui para ver se eu deixo’ ou ‘vou pensar no teu caso’ ou ainda a célebre ‘vai indo que já lá vou ter’ não deixam dúvidas quanto à sua função semântica: elas são usadas para mostrar ao Grunho que nos tenta enganar que já lhe conhecemos o Patuá.
E não é decerto por acaso que, de alguém capaz de levar outrém na sua conversa, se diz que « é tipo com um grande Patuá ». A existência do Patuá é reconhecida pois por todos, embora muitos Totós continuem a não ver relevância nesse facto.

Como se ramificou o Patuá até desabrochar nas línguas actuais?

Como se ramifica qualquer árvore, a genealógica incluída: de galho em galho, até ao rebento final. Certas línguas denotam porém maior influência do Patuá primitivo que outras, daí a superioridade dos povos que as falam quanto à arte de mafiar Totós. Inversamente, os que por fanhosice, gaguez ou tosse convulsa mais se afastaram da sua herança Grunha acabam por se juntar à imensa mole dos Totós.

Friday, April 22, 2011

Requiem por Sérgio Carvalho



Amanheceu como se em mim anoitecesse

porque eu não sabia, não sabia

eu não sabia que já não estavas entre nós

e que escolheste partir

sem um aviso, um queixume, uma acusação

Oh mas eu sei, sei                  

eu sei que eras demasiado digno e generoso

para aceitares esta desumanidade

que não te soube merecer porque já não te merecesse

ou porque talvez nunca te tenha merecido



Amanheceu como se em mim anoitecesse

e eu aqui, prostrado de silêncio e de trevas

surdo para o chilrear das aves

cego para o ressalto da chuva nos beirais e nas folhas

insensível para o frio que me eriça a pele



Já não ouço nada, já não vejo nada, já não sinto nada

senão este horrível vazio

de todas as manhãs que até ao fim dos tempos

hão-de chegar sem ti





(sentidos pesâmes para todos quantos o conheceram e amaram) 


Em cima: foto retirada do seu perfil, no Facebook. Em baixo: do Album Portugal e foto retirada do mesmo perfil (trabalhos de Sérgio Carvalho)











Wednesday, April 20, 2011

Lawrence of Arabia «Films of my life». por Sir Frankie Goethe Wally Wood

As all the cinema fans know, there are two very different versions of this story. I have to confess I just saw the one directed by David Lean, back in 1962, casted by Peter O'Toole, Alec Guinness and Anthony Quinn. It's certainly a colonial vision of the Arab world, but who could expect something different, by the time and place the film was made? In spite of that fact, the film had some qualities for trying to understand the inner drama of such a complex character as Mr. Lawrence, a material man caught in the meanders of History, divided between two loyalties: the British Empire and the sympathy for the rising of Arab rebelion against the Ottoman domination. 
Sent by the authorities of his own country to support the insurgents, for reasons that had nothing to do with the Arab cause (real politics, they call it), Lawrence was not, at all, a typical English man. But somewhere there, in the heart of the Islamic Civilizations, he did find such a new vision of things that he started to doubt and hesitate about his mission. 
He knew, very well, how hypocritical the British intentions were. And he knew, as well, the Arab leaders were more interested in deffending their privileged position than the people they were suposed to protect. But somewhere in his traject, the fascination for the Arab culture, the contact with the wilderness of the Deserts and the humility of the sons of Islam in face of «the ocean of sand», made him learn learn to respect the local tribes, and brought him to the difficult position of making choices. 
The anguish of knowing that in the end he had, necessarily, to betray one of the sides, did chase him until the end of his adventure and even further than that. In spite of a delineation of rebelion against his own fatherland, he made the most predictable choice and abandoned the Arabs to their destination, not without remorse. Once back in England, he wrote his memories paying a late tribute to all he learned amongst the Arabs. «The Seven Pillars of Wisdom», name of that book, is still telling us much more than the typical western vision of that part of the world, and is still a good example of how easy should be to understand our sisters and brothers that were born under other climat, other Religion, other language and Culture. A definitive prove, for those that still need it, that no human should be seen as a foreigner, for sometimes our heart can become, somewhere in our life's journey, bigger than the world...   

(Dedicated to my dear friend Alla Eldinasour with my best wishes of a quick recovery). 


Lawrence of Arabia «Filmes da minha vida». por Sir Frankie Goethe Wally Wood


Todos os fãs de cinema sabem que existem duas versões deste filme. Tenho de confessar que só conheço a que foi realizada por David Lean, em 1962, tendo Peter O'TooleAlec Guinness e Anthony Quinn. Trata-se decerto de uma visão colonialista do Mundo Árabe, mas que outra coisa se poderia esperar de um filme produzido nesta época? Apesar deste facto, o filme possui algumas qualidades, por tentar compreender o drama interior de um carácter tão complexo como o do senhor Lawrence, um homem de carne e osso, armadilhado pelos meandros da História e dividido entre duas lealdades opostas: ao Império britânico e à crescente revolta Árabe contra o domínio Otomano. Enviado pelas autoridades do seu País para apoiar esta insurreição, por razões que nada tinham a ver com a simpatia pela causa Árabe, Lawrence não era um típico inglês. Aí, no âmago dessas Civilizações, ele adquiriu uma visão tão radicalmente nova desse estranho mmundo que o seu coração começou a hesitar quanto aos propósitos iniciais. Ele não ignorava, como é evidente, a hipocrisia dos propósitos dos seus chefes, no apoio que prestavam aos diferentes  líderes e povos Árabes. E também sabia que estes líderes estavam mais ocupados em defender os seus postos do que em proteger os respectivos povos. Mas o fascínio pela cultura Árabe, o contacto com a imensidão dos desertos e a humildade dos filhos do Islão diante de tão esmagadora paisagem, fez-lhe ganhar o respeito por aqueles povos, colocando-o numa posição de difícil escolha. A angústia de saber que teria de trair um dos lados assombrou-o até ao fim da sua aventura e para lá dela. Apesar de um esboço de revolta contra a sua própria Pátria, acabou por fazer a mais previsível das escolhas, mas não sem remorso. De volta a Inglaterra, escreveu as suas memórias como um último tributo aos Árabes que aprendera a respeitar. Os «sete Pilares da Sabedoria», assim se chama o livro, ensina-nos muito mais do que a visão  ocidental de um mundo que o seu povo achava desinteressante, pois ainda é um bom exemplo de como seria fácil entender os que nasceram sob outra Cultura, outro Clima, outra Religião e outra Língua. A prova definitiva, (para quem dela ainda necessita) que nenhum humano é estrangeiro, porque o nosso coração pode muito bem, num qualquer ponto do nosso percurso, tornar-se maior que o mundo...   

(Dedicado ao meu caro amigo Alla Eldinasour com os meus desejos de uma total e rápida recuperação da sua convalescença).  

Os Razíadas, canto terceiro: estr.1 a 4

Agora tu, míope me ensina

O que te contou quem tanto gama


Esse imoral canto, mister de rapina

Que em três lustros já nos fez a cama

E os remédios da falsa Medicina

Da indústria FMI que bem nos trama

Fazem subir a febre que nos postra

E ainda nos impinges tua bosta



Põe tu, lá no pasquim que já não leio

As mentiras, futilidades e patranhas

Embrulha-as no teu pérfido paleio

E ignora o que importa, com tais manhas

Qu'o tanso viva calmo e sem receio

Ouvindo só o rumor de suas entranhas

Entretido qu'anda com tuas lábias:

Veras bestas eu tenho-as por mais sábias



Jornais e tv's entregues a sabujos

Públicas empresas, só lucrativas


Prós privados: ah os negócios sujos

Sob a mesa, e os habituais convivas

Tão finos e contudo tão obtusos

Comendo das gamelas colectivas

Nem dão conta que perfazem uma Vara

Ou se dão, cuidam que ninguém repara


Ah temperem os suínos com Loureiro

Acendam os Cavacos na fornalha

Coloquem todos os tachos no braseiro

Que quando o estâmago do povo ralha

A carne é de quem a apanhar primeiro

Mesmo se fede, como a da gentalha

A quem nossa miséria tanto deve:

Que já nem a Terra lhes seja leve...



 (Continua na próxima quarta feira)   

Tuesday, April 19, 2011

História Universal da Cuskice - pela Dra. Glória d'Anais de Guerra e Antas


(Continuação do capítulo a invenção da linguagem, iniciado ontem...)


Porque a violência não bastou, como linguagem? 


Evidentemente a violência tem as suas limitações e o Grande Grunho não pode andar sempre a castigar os prevaricadores. Porque precisa sempre de uma base social de apoio? Nada disso! . A grande razão é de outra ordem: como os macacos pelados são prevaricadores inatos, castigá-los sempre que passam das medidas, (não obstante a realização profissional que tal possa proporcionar a um chefe), cansa muito. 

Por essa razão, os Pelados depressa descobriram o perfeito sucedâneo da violência: a ameaça. Pelo recurso à intimidação, o chefão mantém a autoridade sem ter de andar sempre a distribuir pancada. A partir de agora, ao Grande Grunho, macho dominante, basta-lhe arregaçar o lábio superior, mostrar a dentuça e rosnar, para que qualquer aventureiro entenda o aviso pelo menos tão bem como nós entenderíamos frases como ‘se tocas na minha carne, levas na boca’ ou ainda ‘se voltas a olhar assim para a minha sócia, arranco-te os olhos’. Sim, que nesse tempo valia tudo, incluindo arrancar olhos. 

Porque razão a ameaça também não bastou, como linguagem? 

Porque a ameaça só vale quando suportada por algo. Neste caso, esse algo começou por ser a mão aberta, depois passou a ser a mão fechada, finalmente uma mão fechada com um pau em riste. Foi Grunho 4, não necessariamente o tetraneto do Grunho anteriormente referido, que, com o pau que sempre o acompanhava, inventou a nova linguagem. Sempre que se zangava, pegava no pau e gesticulava. Consoante o número de voltas e reviravoltas que ele imprimia ao bastão, num ou noutro sentido, assim os seus seguidores entenderiam coisas muito elaboradas como: ‘ Onde estão as coxas do coelho que eu cacei? Acusem-se ou sai paulada!!!’. Ou ainda: ‘ Ou me calam essas crias ou os lobos vão chamar-lhes um figo»’ e sobretudo: ‘Agora vou tirar uma soneca e ai de quem me acorde!’. 

Além da chamada língua de pau, a introdução deste material na vida dos hominídeos proporcionou à raça grandes progressos nas áreas da agricultura (antes abriam-se buracos na terra com os dedos), da caça (melhor caçar com um pau do que à unha), na pesca, na indústria de fabricação de lanças, de flechas, de dardos e, é importante não esquecê-lo, de palitos para os dentes. Mas antes de ser aplicada em todas estas áreas, o pau serviu, de início, (e como sempre) fins exclusivamente militares. 

Só os esbirros de Grunho 4 e ele mesmo, podiam usá-los. E se os usavam: o chefe e seu gang viviam agarrados aos respectivos bastões. Em todo o caso, não estavam dispostos a permitir que outros, além deles, os possuíssem ou usassem. Esta primeira forma de aristocracia baseava-se portanto, não na posse na terra, mas na posse de um cajado de carvalho rijo, que pudesse ser usado, a qualquer momento, no lombo de um plebeu recalcitrante. E todavia a restrição de posse de um tal instrumento não se revelou realista: naquele tempo, havia paus a dar com um pau. Florestas imensas, extensões incalculáveis de vegetação, não faziam outra coisa senão produzir paus de todos os tamanhos e feitios. Além do mais, mesmo entre os vizinhos Totós, já as mulheres usavam paus para fins vários, o que colocava os Grunhos em desvantagem, caso se vissem atacados. Foi pois com mágoa que, perante a ameaça dos Totós, O G. Grunho 4 se viu forçado a armar e treinar toda a tribo, mulheres e crianças incluídas. 

Aqui, teve uma surpresa: no tempo do soco, da dentada e do pontapé, a luta era mais previsível. A introdução do pau nas contendas veio baralhar o cristalino princípio da força bruta. Agora, graças a uma inabilidade inexplicável, havia um ou outro lingrinhas e uma ou outra mulher que compensava a falta de força física com alguma destreza no manejo do instrumento, tanto para comunicar como para punir . O Grande chefe arrependeu-se do seu ousado passo porque, desde aí, além das habituais sopapos que levava da mulher, passou também a levar paulada de súbditos cuja existência, até aí, não se apercebera. 

Não chegou porém a ser destronado porque, diante da ameaça dos Totós, ninguém quis assumir a condição de chefe. Era um mau presságio que, tendo um chefe fraco, os Grunhos tenham decidido não alterar o status quo, convencidos que, em caso de derrota, o Chefe e seus acólitos seriam os principais (com sorte talvez os únicos) alvos da ira do inimigo. Talvez por terem a noção da superioridade do adversário no manejo do pau, os Grunhos já partiram para a guerra derrotados, não admirando, por isso, que a derrota efectiva da tribo se consumasse ao fim de breves escaramuças. 

O descalabro tornou-se evidente desde que Nhunho, o campeão do pau entre os seus, tombou de queixos depois de um breve duelo com o minorca Moka 6, um dos mais enfezados guerreiros Totós. Terá sido no momento em que o pau do baixote abriu como a uma melancia a cabeça do troglodita inimigo que o Grande Grunho, do alto do montinho de onde via a batalha, pronunciou, pela primeira vez, uma palavra cujo sentido todos entenderam: FUJAM!!! 

E efectivamente, deslocadas algumas clavículas, rachados alguns crânios, partidas algumas costelas e dentes, todos os Grunhos que ainda tinham pernas intactas correram pelas suas vidas. Os que só tinham uma perna tentaram fugir a pé coxinho. Um terceiro grupo tentou arrastar-se. Poucos escaparam à ira dos Totós que, após a vitória, denotando pouca esperteza, tomaram mulheres Grunhas como esposas de guerra.

(continua na próxima segunda-feira)

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Viseu, Beira Alta, Portugal
autor satírico, cartoonista pseudónimo de António Gil, Poeta e Ficcionista, Não sectário, Agnóstico, Adepto Feroz da LIberdade de Imprensa e de Opinião...

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