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Sunday, June 19, 2011

Livro quatro de «A Bíblia, Nova ver$ão: O livro dos Jobs (e dos Boys)

Naquele tempo, andavam os Boys mui preocupados com o único futuro que lhes interessava (o próprio, pois claro, que de indiferença perante os futuros alheios estavam eles bem calejados). 
E tudo porque corriam sobejos rumores que muitos iriam deixar de receber as benesses do Senhor, em virtude dos escassos recursos daquela Santa mas mui pobre Terrinha. Quando finalmente tais rumores se confirmaram da pior forma, a impaciência deles já se tinha tornado fúria: indignava-os a diminuição de Ministros do Senhor mas mais ainda que alguns desses novos Sacerdotes tivessem vindo de tribos alheias. Para expressarem a sua indignação, resolveram então fazer chegar ao Senhor as suas queixas. Como o Senhor se tornara inacessível, dirigiram-lhe uma missiva escrita por Jemerias, o mais eloquente dos descontentes. Escrita num misto de contenção e revolta, a missiva rezava assim:
«O teu nome seja louvado, ò Nosso Senhor (pelo menos até ao próximo Congresso). Venho por este meio protestar contra as tuas mais recentes escolhas. Bem sei que, por enquanto, teu é o Reino das coisas cor de laranja e derivados e agora, por tabela, também de algumas coisas azuis e amarelas: mais quatro côres e dominarias este mundinho cinzento na totalidade. 
Porém, cabe-me lembrar-te que é por seres o Senhor das coisas cor de laranja que não compreendemos como resolves deixar tantos de nós de fora das tuas escolhas. Serão alguns de nós laranjas, outros clementinas e ainda uns terceiros tangerinas ou não seremos todos nós filhos da mesma citrina mãe? 
Isto ainda é mais grave quando tu e os pasquins todos deste sobanato falam dos sem-côr que convidaste. De repente ficou tudo cego  ? eles são sem côr em quê? na verdade, muitos deles até já trocaram de côr algumas vezes e não é por se dizerem sem côr agora que se tornam mais populares. 
Fica sabendo, Senhor que nós ficámos de todas as côres quando soubemos que fomos preteridos por gente capaz de vestir qualquer camisola, embora saibamos bem que isso te facilita a tarefa: quanto mais eles se disserem sem côr, mais tu podes colori-los das cores que bem entendes. No fundo, tu bem sabes que os ditos sem-cor serão ainda mais dependentes de ti do que nós seríamos, porque não te ajudaram a eleger  Senhor, nem têm sido, como nós o apoio de algumas bases de todas as coisas laranjas. 
Tu vais decerto, ò Senhor, manobrá-los melhor até do que nos manobrarias a nós, e mesmo se te apetecer despedi-los, ser-te-á mais fácil pois sabes que todos os que se habituaram a identificar com o Universo das coisas cor de laranja, hão-de aplaudir essa decisão. 
Também não compreendemos, Senhor, como pudeste não pensar em nós: se não havia lugar para os teus fiéis súbditos aqui, porque não nos mandaste para outros lugares, mais giros e cosmopolitas? 
Num passado ainda não muito longínquo, os Senhores que te antecederam fizeram isso e assim muito satisfizeram aqueles que os serviam. Bem sei que vais dizer que estamos em tempos de vacas magras, pois longe vão os dias das ministras anafadinhas mas que diabo: mesa onde comem onze ministros pançudos, duzentos e vinte assessores com barriguinha, 360 secretárias elegantes, 500 motoristas que carregam no tintol e 750 guarda costas consumidores de EPO, queratina e outras hormonas, também outros tantos, com as mesmas características ou não? bastava que cada um comesse menos um bocadinho e que se estragasse menos um bocadão (que nestas coisas, o desperdício é grande, como sabes, pois faz parte do estatuto). 
Não entendemos ò Senhor, que nos andes pois a submeter a tais SACRIFÍCIOS, como se fôssemos todos iguais a esses parolos que sangramos no altar para a pagar as crises que nós fazemos! 
Francamente, ò Nosso Senhor, vais pensar no assunto ou vamos ter de, mais uma vez, coser outro Deus, desta vez com melhor barro? 
Teus nunca eternamente servidores (seguiam-se 360 assinaturas, número decerto excessivo para os Ofícios que ainda podiam ter esperança de ocupaR.

Quando esta missiva chegou às mãos de um dos assessores do Senhor, este pensou duas vezes: entregá-la ou não ao Amo? afinal de contas não era assunto sobre o qual ele gostasse de responder pessoalmente, até para não se incompatibilizar com gente a quem no passado, ficara igualmente a dever favores. Deixou a carta de lado e quando o Ministro dos Ministros chegou ao seu gabinete celestial (já próximo da hora do almoço, que o seu Divino sono era mais importante que tudo o que se passava nas esferas inferiores), depois das vénias e salamaleques habituais, colocou-lhe a carta entre mãos. Atrapalhado, o Senhor deixou-a cair e mui INDIGNADO assim falou:
- Olha lá, ò cromo, não estás á espera que eu LEIA uma carta pois não? afinal eu pago-te para quê? ou queres que eu, ocupado como ando, ainda tenha tempo para fazer em casa revisões de Leitura? achas que tenho tempo para reaprender o Alfabeto? e o soletrar das sílabas? e as regras orto... orto...tu sabes! para que seria eu o Senhor se tivesse que LER? e lembrar-me destas coisitas da instrução primár... errrr básica, pois agora chama-se assim....pffff!
- Mas senhor -disse o Assessor algo encabulado enquanto se baixava para apanhar a carta caída- esta é uma daquelas a que eu não sei responder: veio dos nosso próprios Templos de Culto das Coisas Cor de Laranja!
- Ah sim?- perguntou o Senhor de súbito interessado- ora passa para cá! Hmmm! deixa cá ver, é o que eu pensava. bom papel, este.
E para surpresa do seu principesco funcionário, começou a fazer um belo aviaozinho de papel. Depois, com ar muito sério, ordenou ao assessor que abrisse a enorme janela que dava para a rua. Soprou na ponta do avião (para aquecer os motores, disse ele), fez pontaria e arremessou-o com força.
A pequena aeronave foi direitinha bater, de focinho, na parede. O Senhor não se atrapalhou com o escandaloso falhanço: pegou no avião sinistrado, amassou-o, aproximou-se do cesto do lixo e tentou fazer um «afundanço»: voltou a falhar.
-Irra que este não acerta uma, disse o assessor entre dentes. O Senhor sorriu e jovial ordenou ao seu lacaio: 
- Oh pah, deita tu isso no lixo, que eu também já me destreinei destas coisas. Bom, hora do almoço. Eta dia cansativo: estou cá com uma fomeca!...

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Viseu, Beira Alta, Portugal
autor satírico, cartoonista pseudónimo de António Gil, Poeta e Ficcionista, Não sectário, Agnóstico, Adepto Feroz da LIberdade de Imprensa e de Opinião...

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