Vê-se o tugúrio de Dani, um jovem promissor astrólogo, na corte de Nabuco, imperador da Gabalónia. O rapaz dorme na sua enxerga, quando um raio de luz azulada desce sobre ele. Ouve-se em voz off:
Ouve com atenção, Dani: Neste momento, Nabuco dono e senhor dos Hartitas, Fartitas e Catitas, imperador dos reinos Caldaicos, Baldaicos e Malaicos. está a receber em audiência privada uns mercadores que lhe trazem estranhas papoilas brancas da longínqua Galáxia do Meio, duma estranha terra descrita em velhas narrativas como o país dos Lotófagos.
Não tarda nada, o Sr. Nabuco estará a ter uma visão, com uma moca tal que puf! verá, em contrapicado, um Gigante maior que Gilgamesh, a cabeça em ouro, peito e braços de prata, ventre e coxas de cobre, pernas e pés de ferro e pila de barro –este último detalhe ele irá omitir quando contar te contar o sonho.
Ouve-me bem, Dani, acontece a todos, um tipo às vezes abusa e bebe um copito, outras bate com a cabeça na parede, e nessas alturas vê-se sempre muita coisa: estrelas, passaritos, espirais, mas tudo acaba de passar com o tempo, certo? Não! porque desta não vai passar e Nabuco, vai mesmo querer saber porque é que viu o que viu, chamará todos os sábios, magos e demais funcionários públicos a quem compete o pelouro do Sobrenatural, ouvirá pacientemente as mais disparatadas teorias sobre os significados do seu sonho e assim descobrirá, para grande escândalo seu, que andou a sustentar uma cambada de pançudos incompetentes, verdadeiros polidores de esquinas e apanhadores do caroço, gentinha não só incapaz de mencionar a verdadeira causa de seu estranho sonho, o ópio que ele fumara por curiosidade na mesma noite, mas pior do que isso, apesar dos milhões gastos em acções de formação, dará conta que possui funcionários sem o mínimo sentido de coerência narrativa, gentinha que dá três erros em cada duas palavras, gentinha que já nem se lembra dessas coisas remotas que são as constelações, os astros e a gramática mas que em compensação evita cruzar-se com gatos pretos.
Ouve-me bem Dani, tens três trunfos em relação a essa cambada de assalariados: o primeiro é a causa do sonho de Nabuco que tu conheces e outros não, o segundo é ter tido acesso à versão original do sonho, estando nas tuas mãos a possibilidade de impressionar o teu Dono quando lhe corrigires a versão retocada, o terceiro é seres um gajo vivaço que vai arranjar uma história decente e bem escrita para que ele, o Sr. Nabuco, perceba finalmente que andou a financiar umas Universidades Públicas que não valem um caracol, incapazes de competir com um escravo, ainda por cima estrangeiro e semi-analfabeto como tu...»
E puff! Lá desaparece a voz off. Daniel acorda sobressaltado e já não é capaz de voltar a dormir. Eis a oportunidade que ele esperava: uma entrevista então, com o Manda-Tudo da Gabalónia? E saber assim, com antecedência do seu sonho?
Agarrou-se ao trabalhinho e lá construiu uma explicação plausível para todo aquele Imperial delírio. Só uma coisa o atormentava: devia ou não mencionar o pormenor da pila de barro? e se sim, como enquadrá-lo numa lógica coerente sem que o Soberano se ofendesse e lhe arrancasse a sua? A sua preocupação não era vã porque conquanto Nabuco não tivesse reputação de Soberano cruel, todos sabiam que ele era muito susceptível a certas alusões relacionadas com o tamanho daquele seu apêndice...
(continua no próximo domingo)
(continua no próximo domingo)
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