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Sunday, March 13, 2011

G€N€SIS: A NOVA VER$ÃO (continuação)



  12- Estamos agora diante de Maizés, cuja figura de gajo em vias de ser Patriarca alterna com um continuum filmado em travelling ,da multidão para quem ele discursa:
- Pessoal: vim agora de falar com o faraó e tenho boas notícias: podeis fazer as malas que amanhã partiremos: levai agasalhos que de noite o deserto é um gelo. Ah, e arranjem ouro e prata que as viagens custam sempre algum....
-.Perdoa-me, Maizés- disse um que estava perto do palanque- vamos como? não vejo carros de bois nem navios que transportem tanta gente...
-A penantes, meu caro- retorquiu Maizés com um sorriso nos lábios.
- Nesse caso- respondeu- como já não sou jovem e só me faltam uns dias para a reforma, vou ficar por aqui mesmo, Isto nem é tão mau como isso...
- Como?- atalhou logo o irado Maizés- não fica cá ninguém do meu povo, ouviste? Nós não precisamos das migalhas dos Egípcios.
Gerou-se um enorme borburinho, alguns pareciam mesmo recalcitrantes:
- E o meu filho? Ele casou-se com uma moça de cá, os meus netos nasceram todos cá...
- O teu filho vem connosco, a mulher e os filhos ficam...
- Oh, oh, isso é que era bom!-disse alguém no meio da multidão...
- Quem disse isso?-inquiriu, mui zangado, o líder. Como não houvesse resposta, continuou- bom, vou fingir que não ouvi. Meus caros, isto é muito simples: quem vier, terá direito ao seu pedaço de Terra Prometida e...
- Mas eu não sei cultivar: há anos que não faço outra coisa que não seja cozer tijolos!-ouviu-se no meio da multidão
- Quanto a mim-disse uma mulher- só vou se lá houver mercados de pronto-a-vestir e cabeleireiros, como aqui.
- Basta!!! –disse então Maizés passando-se da mui respeitável cabeça- têm de ir todos! Todos perceberam?
- Ah sim? e quem nos vai obrigar? Tu?-perguntou um jovem, em tom jocoso.
- Quem vos vai obrigar? Ah, ah, ah...olhem lá para cima! - a turba olhou o firmamento, mais com curiosidade do que receio.
- Não me refiro ao céu, idiotas. Olhem para para aquela duna maior. Estão a ver os carros de combate? Pois pertencem ao B.I.F. (Brigada de Intervenção do Faraó) quem não vier está feito ao bife....
Um frémito de medo percorreu a multidão. Maizés aproveitou a oportunidade:
- Com que então pensam que fui eu que o convenci a deixar-vos partir? Nada disso, meus amigos, foi ele quem nos despediu, a todos! E deu-nos vinte e quatro horas para nos pormos na alheta!
- Despediu-nos? E as indemnizações?-perguntou um, pouco convencido.
- Quais indemnizações? Vocês foram todos despedidos com justa causa. O faraó vai deslocalizar as empresas onde vocês trabalhavam.
- Oh Maiszés- disse uma mulher, de nome Madalena, chorando mais que a outra Madalena (que de resto ainda nem era nascida)- tu, que tens influência lá no Palácio, convence o Manda-chuva a mudar de ideias. 
- Como? Quereis ser escravos a vida toda? Nada feito: o Faraó deixou claro que não cederia a lobbys, cunhas ou grupos de pressão!
  E a multidão lá se retirou conformada.
E foi assim, com a noite ainda pela frente e o exército Egípcio por trás que se iniciou a grande travessia dos descendentes de Néo. Andaram para trás e para a frente, aos círculos, durante quarenta anos, (Maizés tinha péssimo sentido de orientação), o que provocou grandes revoltas como esta:
- Maizés – disse o seu irmão Araão- está ali uma chusma de gente que quer falar contigo e vêm com cara de poucos amigos...
- Eles que nomeiem um representante, que a minha tenda é pequena...
- Oh, já nomearam, ele está aqui à porta da tenda. Mando-o entrar?
- Sim, mas desta vez, que não descalce os sapatos: fico com dores de cabeça com o cheiro desta malta...
- Podes entrar, pá!
- Com licença- estás aí dentro Maizés? Está tão escuro que não se vê nada...
- Sim, estou. aproxima-te, puxa um tapete e senta-te no chão, meu filho...
O porta-voz dos descontentes assim fez e, a um sinal de Araão, tomou a palavra.
- Pois bem, venerável Maizés, irei directo ao assunto...
Tirou o caderno reivindicativo do bolso e...
- Em primeiro lugar, o pessoal anda descontente com a distribuição do maná: dizem que cai sempre nos mesmo regaços, que há famílias numerosas a receber menos de uma mão-cheia, enquanto outros, menos numerosos, são brindados com enormes quantidades que depois vendem no mercado negro. Bom, passemos ao segundo ponto: o pessoal anda farto de caminhar sem destino e...
- Basta: não quero ouvir mais...
- Mas do meu caderno constam mais trezentos e sessenta e quatro pontos...
- Por isso mesmo: tenho mais que fazer do que ficar a ouvir queixinhas...
- Como queiras, mas e o pessoal lá fora vai-se passar se não nos ouvires...
- Que se lixe! Tenho Deus do meu lado e isso é quanto basta...
- Ah sim? Ele está do teu lado hein? A malta já desconfiava, tinha de haver corrupção ao mais alto nível para que o maná caísse sempre nas mesmas mãos. Tudo bem, não há crise: já que o Manda-Chuva está contra nós, vamos cozer outros deuses...
- Como? Terei ouvido bem? ò impíos ainda não entendestes que não tendes poder para elegê-Lo, que foi Ele, quem vos elegeu a vós, como seu povo? ...
- Estranho conceito de Democracia o teu, Maizés ...
- Ai de ti, ò rebelde, que leves àvante a tua ameaça. Estás avisado. Ei!!! volta aqui, já: eu não te mandei retirar...
- Ah não? então anda  ver se eu já não estou cá fora- E com isto saiu ao encontro da multidão que o aguardava, impaciente.
- E atão? O tipo vai ou não vai tomar medidas?- perguntou Malukias
- Ele concordou com aquela parte dos divertimentos nocturnos? –quis saber Moinakerias
- E a água para tomar banho e lavar roupa? Vai haver ou não? - perguntou Lisabeta, mulher de Sovacan .
Jáuscomeu ergueu um braço em sinal que ia falar:
- Voltemos ao acampamento. Aí vos farei o ponto de situação. Não quero falar aqui porque, como sabeis, as peles das tendas têm ouvidos...
E logo, durante o caminho, a mente retorcida de Jauscomeu, a planeando a forma de tirar partido daquela situação. Fazer um Deus, não era coisa que atrapalhasse o chico-esperto, que já fundira muito metal para encher moldes e moldes de deuses de todos os tamanhos, para todo os gostos e feitios: esfinges, deuses com cabeça de chacal, de águia, deuses com caudas de cão e de macaco, deuses com pés de cabra e de patas de elefante, deuses com cornos de boi e com pele esverdeada, deusas boas comó trigo do nilo ou anafadinhas como funcionárias públicas à beira da reforma. Ocorreu-lhe a vaca por ser o maior animal doméstico. O ouro, era naturalmente forçoso para inaugurar um novo culto, ninguém estranharia que se fizesse uma colecta e –é claro- que o que sobrasse...
- ...Isso de fazer uma estátua a outro deus parece-me bem – disse Aarão, quando sondado – nestas coisas, ter um só deus, não é prudente...
- Mas porquê uma vaca de ouro, e não um grilo de ouro? –quis saber um dos menos entusiastas com a ideia.
-Porque um grilo tem menos força que uma vaca...
- Nesse caso – atalhou Aarão- o melhor é fazer uma baleia de ouro...
- Baleia? Ná!!!– discordou Babalão – essas só andam na água, o melhor é um elefante de ouro...
- Como queiram- disse Jauscomeu esfregando as mãos de contente- um Elefante é, de facto, maior e mais poderoso que uma vaca.
- Eu discordo- intrometeu-se de novo Jamenotaram- Por mim, um grilo também estava bem, cada um contribuía com uns pozinhos e ...
- Oh povo que regateais o ouro, sem cuidar da imagem de sovinas que dais, diante do olhar vivo da nossa Divina Deusa- escandalizou-se Jauscomeu – pois não sabeis vós, criaturas ingratas que um grilo não tem nada que se coma, enquanto a Divina Vaca é a razão de haver leite suficiente para crias vacas e crias humanas...
- Que queres dizer com esse palavreado todo? –perguntou a maioria que era analfabeta.
- Que quem preferir um leite quentinho a grilo na brasa deve votar na moção da Vaca de ouro como nossa Deusa mãe. Por falar nisso, quem prefere...
- Eu, eu eu, eu , gritaram várias vezes todas as vozes.
- Anota aí, ò Nupapel a maioria esmagadora votou pela Vaca de ouro como nossa Deusa Principal...
- Protesto- insurgiu-se Talkerias- nem te deixaram acabar a pergunta...
- É sinal que tanto lhes faz, e nesse caso prevalece a minha posição ...
E logo ali começou a colheita de ouro, e também os desvios, pois os funcionários de Jauscomeu, Ladraão incluído, foram deitando a mão ao que podiam. No fim cada um desviando na medida das suas oportunidades, chegaram à conclusão que o ouro só chegava para um bezerrito e foi um isso que fizeram.
Claro que, quando Maizés chega ao acampamento para dar de caras com o seu povo de cócoras perante um deus pagão de quatro patas...
- AH; INGRATOS; INFIÉIS ... E QUEIXAVAM-SE QUE ERAM TODOS UNS POBRETANAS HEIN? POIS EU, QUE SOU, POR DIREITO DIVINO, O VOSSO CHEFE, NUNCA TIVE UM COLAR; UM BRINCO; UM ALFINETE QUE FOSSE NEM SEQUER DE PRATA, QUANTO MAIS DE OURO...
- Onde todos ajudam nada custa- diz Jauscomeu com um sorriso amarelo.
-Ah! Ouvistes otários? –pergunta o Patriarca furioso- Se todos ajudastes com ouro, como é que só deu para um bezerro raquítico??  Se cada um de vós desse um só anel, isso teria dado, no mínimo um touraço de cobrição.
- Uma anel? –diz Lérias-  eu dei-lhe um fio de sete voltas ...
- E eu?-diz Gabassebem- com as minhas braceletes, os meus aneis, ele levou-me pelo menos quinhentos quilates...
- Vistes? Vistes?- aproveitou logo Maizés, mesmo sabendo que os tipos estavam a inflacionar- e ainda acreditais neste chulo? Pois eu, se fosse a vós, ia fazer uma revistinha à tenda do tipo...
- Boa-ideia- disse logo Midas, um dos que se arrependera de ter dado o seu rico ouro para aquela estátua sem graça...
- Esperem, esperem- gritou o Jauscomeu., antevendo a sua desgraça- o ouro que lá está é para fazer outra estátua...e se este deus não nos servir temos que tentar com outro, não é?...perguntou com um sorriso inocente
- Os que primeiro lá chegarem são os que terão direito ao maior quinhão- disse Maizés que a sabia toda, psicologia de massas incluída...
E aí temos o estouro da manada: num ápice, passando por cima de velhos, coxos e crianças, a multidão dirigiu-se eufórica ao local do tesouro. Houve lutas, choro e ranger de dentes e, mil mortos e seiscentos feridos depois, estava o espólio dividido. O espólio todo? de modo algum: aproveitando a debandada, Moisés escondeu o Bezerro de ouro nas areias do deserto e fez um mapa do local. Quando a multidão voltou ao altar onde o bicho tinha sido instalado, só lhe viu o sítio.
- Ei! Onde está o bezerro, Maizés?
- Ele levou-o- disse o Jaucomias sedento de vingança...
- Podeis revistar a minha tenda- disse logo o espertalhão- mas olhai que, se não estiver lá nada, eu vou julgar os responsáveis por difamação...

1 comment:

  1. Excelente! "Puxa um tapete e senta-te no chão...". Permito-me sugerir verificação/corre(c)ção ortográfica.

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Viseu, Beira Alta, Portugal
autor satírico, cartoonista pseudónimo de António Gil, Poeta e Ficcionista, Não sectário, Agnóstico, Adepto Feroz da LIberdade de Imprensa e de Opinião...

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